Hoje (27/9), na série do Projeto Cartas Solidárias, é a vez do Ribeirão Sobradinho contar como se sente para todos. Para expressar essa indignação, o professor, engenheiro civil e doutor em Desenvolvimento Sustentável - Gestão Ambiental/Recursos Hídricos, Demetrios Christofidis, deixou-se ser a voz do Ribeirão neste poema, que conta sobre a poluição e o caminho de suas águas.
Mensagem do Ribeirão:
Com o propósito de ampliar o discernimento das pessoas e a consciência acerca da necessidade de recuperação das Águas do Ribeirão Sobradinho.
Sou Sobradinho, o Ribeirão.
Minha maior realização é a de exercer uma nobre Missão.
A de receber águas do Céu e ofertar vida com muita dedicação.
Sou grato por ter sido escolhido para servir águas com devoção.
Assim, estou a fluir ofertando águas cristalinas em nome da Criação.
Desde as nascentes vou servindo águas à natureza e à comunidade.
Tenho, também, satisfação por conceder meu nome a esta Cidade.
Minhas águas nutrem pastos, flores, frutos e vegetais, em toda sua variedade.
A peixes, répteis, pássaros e animais, presenteando águas à diversidade.
Fluindo à vontade, de modo lúdico, com prazer e satisfação.
Passo por vales e cachoeiras, serpenteando com prazer e generosidade,
Vou ao encontro do rio São Bartolomeu, meu predileto irmão.
Que acolhe minhas águas transparentes, com muita docilidade.
Nesse abraço fraterno e de admiração, existe enorme identificação.
Provém dos abraços de nossas águas, do afeto e da amabilidade.
Essa convivência, de recíproca adoração, coroada de presentes.
São dádivas a meu irmão; águas doces, cristalinas, frutas e flores e sementes.
Atualmente, porém, ao chegar à foz, sem presentes, sem brilho, sem vibração.
Quando me encontro com o São Bartolomeu, sinto dor no coração,
Sem agrados, sem águas doces, perco minha identificação.
Meu abraço contém rejeitos, resíduos da degradação, objetos da poluição.
Fico envergonhado, inapreciável, inapto, sem a natural preciosidade.
Os afagos e os entrelaçamentos são fracos, sem sentido, sem encantamento.
Carregado de restos e dejetos, de águas sem brilho, espelho inutilidade.
Não há festejo no encontro, só desilusão e desmerecimento.
Resíduos provindos de todo lugar,
sinais de desprezo, desrespeito e malcriação.
Com vergonha, não consigo abraçar, brincar, murmurar.
Que desolação! Vivenciar essa contradição.
Veja São Bartolomeu!
Olhe, amigo e irmão meu!
Quanto menosprezo, insensibilidade e falta de responsabilidade.
Destroem as águas, ferem meu ser e minha habitual amabilidade.
Faço o melhor que posso, tenho o dom da passividade e da afeição.
Nunca imaginei que sofreria ao servir água, o maior bem da Criação.
Desejo exercitar com plenitude a caridade hídrica e a fraternidade.
Não entendo, porém, por que sou tratado sem nenhuma dignidade.
Como exercer as virtudes e minha missão com efetividade?
Será que ainda existe algum sentimento de amorosidade?
Há discernimento e consciência nessa denominada humanidade?
Demetrios Christofidis, 31 de agosto de 2020.
Professor Demétrios, acabo de sentir imensa gratidão! Por percebê-lo fundido à água e ser porta-voz do Ribeirão! Meu domingo ficou mais feliz depois dessa poesia-provocação... qual será o tamanho da vergonha dos responsáveis nessa questão? Resposta: no mínimo 28 Km, a extensão do Ribeirão.